FESTIVAL DO RiO - PARTE 5



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O ASSASSINO EM MIM (Idem, EUA/Suécia/Inglaterra/Canadá, 2010) de Michael Winterbottom
 
Quanto pesa um trauma acerca da imposição social de manter a límpida imagem da sanidade? A adaptação do livro de Jim Thompson pelas lentes de Michael Winterbottom busca satirizar a utopia americana através de consequências brutais em The Killer Inside Me. O paralelo entre o tempo registrado em cena, marcado pelo conservadorismo com a crescente violência e a falsa liberdade dos dias atuais está em brechas dos belíssimos diálogos. A corda que cada vez mais aperta o pescoço do xerife Lou Ford (Casey Affleck) após um premeditado e ganancioso crime pode servir como uma instigante trama onde remorsos e interesses falam mais alto, mas é ofuscada perto da rica analogia social feita pelo diretor, que consegue abstrair julgamentos finais para debochar de seu protagonista. Por vezes silencioso e discreto, por outras, explora o lado oposto. Em ambos é bem sucedido por manter uma leveza narrativa. A opção é inteiramente do espectador. Se julga ou não, se analisa uma unidade ou um personagem e uma narrativa ou uma situação completa. Enquanto monta um labirinto para uma redenção que alimentaria muito mais o ego do que a alma de Lou Ford, Winterbottom utiliza-se de diversos elementos para, apenas, “sugerir” um culpado desta história num dos encerramentos mais incríveis do ano.


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NOSSA VIDA EXPOSTA (We Live In Public, EUA, 2009) de Ondi Timoner
 
Josh Harris abusava do seu "dom" visionário. Criou o primeiro canal de TV em transmição via internet e tinha total conhecimento do cunho anárquico deste dispositivo. Seu plano era derrubar as grandes emissoras que ainda não tinham assimilado a importância da rede internacional de computadores. Nossa Vida Exposta, filme que ganhou o prêmio de melhor documentário em Sundance, mostra que ao mesmo tempo, a mente de Harris buscava analisar uma geração antes do lucro. O que, logicamente não acabou em boa coisa. Harris acabou num experimento que batiza o filme. Era uma espécie de vídeo-arte com Big Brother. O lado “arte” do projeto estava nas instalações surrealistas e na idéia de utilizar humanos como objetos de análise. E como o próprio dono, suas cobaias confundiram as coisas. A partir daí, a diretora Ondi Timoner nos dá a chance de estudar o comportamento de um homem que fazia o mesmo a partir da quebra de privacidade, que é a maior característica da última década, seja pela TV, pelo telefone ou computador. Um tempo depois, passou a transmitir sua vida em tempo real pela internet através de câmeras instaladas em todos os cantos de sua casa. Apesar de ser extremamente figurativo e até didático em certos momentos, o filme de Timoner é rico por não usar seu personagem como influência e sim de grande vulnerabilidade, atrás de todo o poder e tendência que ele representou. Seus traumas pré e pós a experiência são colocadas num formato de fácil assimilação, pois transformam o modelo documental em narrativa.

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ZONA SUR (Idem, Bolívia, 2009) de Juan Carlos Valdivia 

O terreno pelo qual o diretor Juan Carlos Valdivia caminha em Zona Sur é perigoso. Em pouquíssimas variações de movimentos de câmera – em boa parte deles desenhando a mis en scène em todo o cenário lentamente -, ele analisa a situação social do país através do cotidiano de uma família rica de La Paz. Aparentemente estereotipados, os personagens, aos poucos, desenvolvem seus conflitos usando a mãe – coluna da casa – como ponto de partida. A ausência da figura paterna e o pouco tempo para uma dedicação plena aos filhos não parecem incomodar Carola, dona da casa que não gosta muito de falar sobre seu trabalho. Silenciosamente, Valdivia desenha a importância da mãe como pilar de uma casa que não expurga problemas grosseiramente. Nenhuma. O grande dono da casa é Wilson, mordomo da casa, que há seis meses não recebe salário. O laço fraterno entre ele e os filhos de Carola parecem muito mais fortes. Enquanto desenvolve esta análise, o mesmo aspecto técnico é repetido. Cenas em plano-sequência, onde câmera e personagens criam uma relação curiosa. Personagens perseguem a câmera. A câmera procura os personagens. É interessante, mas em certo momento do filme já estamos calejados e tal proposta vira previsibilidade.
A importância que Valdivia dá à linguagem implícita para desconstruir um cenário político é o grande pulo de Zona Sur. Um filme de impressões externas (câmera apenas como testemunha) sobre relações humanas, onde distintas visões sobre a vida compõem uma enorme distância entre as pessoas. Por mais próximas que elas estejam.

2 comentários:

  1. Tenho amigos virtuais que já viram "The Killer Inside Me" e as reações foram distintas. Uns acharam uma maravilha assim como você. Já outros consideram uma bobagem. Não sou fã do cinema de Michael Winterbottom, mas assistirei ao filme, cuja provável brutalidade me deixou curioso.

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  2. Bela atuação de Casey Affleck hein? Merece ser nomeado ao Oscar. Um filmaço.

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